Congresso Nacional aprova projeto que cria Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais.

 
Texto, que traz maior segurança jurídica para a continuidade de projetos de PSA, é fruto de raro consenso entre setores ligados à proteção ambiental e ao agronegócio


Por WWF-Brasil

 
O Congresso Nacional aprovou nessa segunda-feira (21) o projeto de lei que cria a PNPSA (Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais). Oriundo da Câmara dos Deputados e fruto de um raro acordo entre setores ligados à defesa do meio ambiente e ao agronegócio, o projeto estabelece as bases jurídicas para que indígenas, populações tradicionais, produtores rurais e outros setores da sociedade possam ter seus esforços de proteção ambiental reconhecidos e valorizados.
 
Com a aprovação da nova lei, serão estabelecidas regras gerais para o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais) no país, trazendo mais segurança jurídica para programas estaduais, municipais e mesmo particulares hoje existentes, os quais, na ausência de uma regra nacional, se vêm às voltas com questões tributárias, administrativas e mesmo civis. Por exemplo, a lei estabelece que os compromissos de longo prazo (normais em projetos de PSA) assumidos por um determinado proprietário rural são transmitidos a eventuais sucessores ou adquirentes do imóvel, ponto fundamental para dar segurança a investidores de que a floresta restaurada ou mesmo protegida não será derrubada com a mudança de titularidade da terra.
 
O projeto também cria um Programa Federal de PSA, o qual unificará os esparsos programas hoje existentes em nível federal (como o Programa Produtor de Água, da Agência Nacional de Águas), dando mais robustez e coerência às ações do Governo Federal, o que auxiliará inclusive na captação de recursos externos ou particulares.
 
Aprovado na Câmara dos Deputados em 2019 com apoio das frentes parlamentares da agropecuária e ambientalista, o projeto foi aprimorado pelo Senado Federal, que corrigiu alguns dispositivos que poderiam impactar programas já em andamento ou levar a uma excessiva centralização, nas mãos de um órgão gestor federal, na definição de regras e métricas para programas de PSA, o que poderia inibir inovações e adaptações de iniciativas locais às distintas realidades do país.
 
Um dos poucos pontos polêmicos alterados no Senado Federal diz respeito à possibilidade de se pagar para restaurar ou conservar vegetação nativa existente em APP (Áreas de Preservação Permanente) ou RL (Reserva Legal), que são áreas protegidas pelo Código Florestal (Lei Federal 12651/12). Muitos entendem que, por serem áreas nas quais já há a obrigação legal de proteção, não faria sentido serem incluídas em programas de PSA, pois se estaria pagando para cumprir a lei. Por outro lado, boa parte dos programas de PSA hoje existentes fazem desembolso para recuperar áreas protegidas por lei, como é o caso de nascentes e matas ciliares. Esse é o caso, por exemplo, do Programa Produtor de Água, da ANA (Agência Nacional de Águas), que paga pequenos produtores para recuperarem matas ciliares.
 
“O PSA é um instrumento econômico que incentiva o cumprimento da lei, é um reforço aos mecanismos de comando e controle, não algo antagônico. Portanto não vemos problema em se utilizar recursos públicos para ajudar um pequeno produtor rural a recuperar uma nascente desmatada há décadas, mesmo que já fosse uma obrigação legal, desde que se demonstre que essa era uma ação necessária para que a restauração ocorresse, ou seja, que sem ela a área continuaria degradada. Não temos que ficar discutindo de quem é a responsabilidade, mas como resolver o problema”, avalia Raul do Valle, advogado e diretor de Justiça Socioambiental do WWF-Brasil.
 
Conteúdo do projeto
Com a aprovação do projeto, o Brasil terá, pela primeira vez, regras federais que permitem ao Poder Público premiar pessoas físicas e jurídicas que praticam ações benéficas ao meio ambiente. De acordo com Raul Valle, o projeto aprovado aponta para uma nova fase da política ambiental brasileira, na qual os instrumentos de indução à adoção de boas condutas sejam tão ou mais relevante do que os de repressão e punição às ações ilegais. “É a institucionalização do princípio do protetor-recebedor, o que se soma ao do poluidor-pagador e, assim, moderniza nosso arcabouço jurídico”.
 
O Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais irá apoiar ações de conservação e a recuperação da vegetação nativa, da vida silvestre e do ambiente natural em áreas rurais ou mesmo urbanas. Pelo texto aprovado, os recursos deverão ser gastos preferencialmente em terras de povos indígenas, quilombolas e de agricultores familiares, reconhecendo o papel central que esses grupos sociais têm na conservação ambiental do país.
 
Haverá um comitê gestor desse programa, formado por representantes do Governo Federal, da sociedade civil e de setores econômicos. Pelo texto aprimorado pelo Senado Federal haverá garantia de independência ao comitê gestor do programa, evitando que haja interferência do governo em sua composição, o que lhe permitirá exercer o devido controle social do uso dos recursos, evitando desvios e malversações.
 
O projeto, no entanto, não traz fontes novas de recursos para fazer o pagamento por serviços ambientais. Essa era uma expectativa inicial, quando o projeto foi proposto, mas a situação fiscal do país impediu que se avançasse nesse sentido. Assim mesmo, representa um avanço.
 
Presidente da CMA (Comissão de Meio Ambiente) do Senado e relator do PL, Fabiano Contarato comemorou a aprovação da matéria pelo Plenário do Senado dizendo que o projeto avança na conceituação e na caracterização de diversas questões associadas ao PSA. “O pagador, por exemplo, pode ser uma instituição pública ou privada, pessoa física ou jurídica. O pagamento pode ser monetário, mas também pode ser feito pela oferta de benefícios sociais, equipamentos ou outra forma de remuneração previamente pactuada entre as partes. A proposição especifica ainda os tipos de serviços ambientais que podem ser contratados”.
 
Contarato destacou que o seu substitutivo foi construído “a várias mãos”, com a ajuda de ambientalistas e representantes de vários setores da sociedade. Ele informou que acatou, de forma total ou parcial, todas as 13 emendas apresentadas pelos senadores.
 
“Além de seu valor jurídico e ambiental, a nova lei tem grande valor político, pois representa, em uma sociedade crescentemente polarizada, a possibilidade de acordo entre setores usualmente antagônicos ‘ambientalistas e ruralistas’, os quais sentaram à mesa para que o texto final fosse aprovado”, ressalta Valle.

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